A água que alimentava a bica vinha de uma nascente longe das vistas e das canelas. Corria por um córrego fino que atravessava muitas terras e chegava a casa pelo alto ao longo da alameda das mangueiras. Ao passar por ali a menina ouvia o burburinho suave da água cumprindo sua sina. Com a curiosidade aguçada, por algumas vezes a menina subira o pequeno aclive para acompanhar o ritmo do córrego e quem sabe descobrir algo novo. Na primeira dessas incursões algo não muito agradável se revelou: ficou verdadeiramente chocada quando deu de cara com frutas e folhas apodrecidas no fundo e beiras do córrego, se diluindo tomadas pelo limo e se entregando às águas que jorravam inocentes lá na porta da cozinha e que era usada para tudo e por todos sem indagações. Para a menina foram necessárias várias vistorias ao longo do córrego para que o fato de ver somente frutas e folhas se desmanchando na água se tornasse aceitável. Com sede e diante da bica, não restava muito a fazer: enchia as mãos em conchas com o líquido azul e geladinho e levava à boca. Simplesmente procurava não pensar na água resvalando na decomposição da natureza. Procurava acreditar que nas mãos ela se tornara doce e pura.
Um comentário:
Eu estava contando para Bia nossas brincadeiras na pedreira e na lagoa. Fiquei pensando em como a pedreira me parecia enorme e como a lagoa era funda e grande. Não sei... mas também pensei que as frutas do quintal eram mais doces, as árvores, maiores, os passarinhos mais coloridos. Sabe, pode acreditas, tivemos uma boa infância. Beijo.
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